O TRAJE EM ALMEIRIM NO 1º QUARTEL DO SÉCULO XX
O traje em Almeirim
O traje que mais caracteriza todo o concelho de Almeirim talvez não seja traje que foi mais utilizado no primeiro quartel do séc. XX mas o sim o que foi eleito para representar a região da planície do Ribatejo na altura do Estado Novo. É preciso ter as devidas atenções quando nos referimos ao traje de Almeirim como mulheres de saia vermelha e homens da camisa branca com calças e colete preto. Seria redutor e pobre caracterizar o traje de Almeirim simplesmente com estas particularidades. A diversidade do traje de Almeirim é de uma riqueza inestimável e de uma beleza singular.
O TRAJE DE FESTA OU TRAJE DOMINGUEIRO
O TRAJE DA MULHER
O traje da mulher de Almeirim é composto pela saia de castorina vermelha plissada com favos de mel a partir do cós até uma altura sensivelmente de 15cm donde nascem as pregas todas juntas formando o tipo de um harmónio.
Em pesquisas realizadas verifica-se que não existiam só as saias vermelhas plissadas, fazem parte as saias castanhas, azuis escuras, azuis petróleo, verdes, cor de tijolo e cremes. Algumas delas, tais como as vermelhas, são marcadas a todo o comprimento com uma risca de cor contrastante. As saias vermelhas são riscadas a preto, as saias castanhas riscadas a creme, as outras são de tecido liso sem risco vertical.
Os casacos (blusa) todos têm a característica do “rabo de bacalhau” em que a parte de trás apresenta um rabo plissado com pregas miudinhas onde assenta o laço do avental. Os tecidos são claros na medida em que são casacos utilizados em dias de festa e têm como padrão flores, bolas, desenhos geométricos entre outros. Sobre o casaco a mulher de Almeirim ostenta um lenço de caxemira com padrões de fantasia onde as flores estão presentes. Estes lenços das costas tinham a função de cobrir o contorno dos seios das mulheres elegantes de modo a não despertar no homem o desejo e a atracão.
Os aventais também sempre em tons claros podiam ser bordados com motivos florais, velutas, arabescos ou laços, ou então decorados com rendas de algodão com diversos feitios. Também com motivos florais são os lenços da cabeça. Os lenços de boal de em amarelo, verde seco, castanho ou brancos eram bordados com cercaduras com motivos florais os de modo geométrico a linha de seda fina. As meias da mulher de Almeirim eram feitas com linha de algodão trabalhadas com 5 agulhas e com a particularidade das carrapetas, pequenos feitios feitos no cano da meia.
O uso da chinela vareira, característica do traje feminino de Almeirim, surge pelas mãos das comunidades vareiras instaladas ao longo do rio Tejo e da vala Real. A mulher de Almeirim assumiu este tipo de calçado como seu e depressa todas as mulheres tinham uma “chinelinha do Porto” calçado fino do dia de festa. Como adornos utilizava a algibeira decorada com pedacinhos de tecido e de veludos onde colocavam objectos pessoais. Se a ocasião era de festa ostentavam u o cordão de ouro de malha barroca ou malha batida com três voltas ao pescoço adornado com medalhas encrostadas em aros de ouro trabalhados. Vulgarmente se usavam as libras de ouro ou as medalhas prussianas. Os brincos eram sempre pendentes de ouro decorados com algumas pedras de cor ou de esmalte sendo os mais comuns os brincos de folha de oliveira, brincos de rabo de bacalhau, brincos de roca, brincos de cabaça, entre outros. As argolas chinesas, de leque ou de espelho conforme queiramos designar também eram comuns. Menos comuns eram as argolas de volta perfeita ou simples pois estas eram mais usuais no dia a dia.
Para abafo eram utilizados os xailes de “foca” com cadinhos compridos onde se destacam os azuis, castanhos e verdes, ou ainda os xailes de adamascado com cadilhos tecidos do próprio tecido ou com fitilho da mesma cor do xaile.
O TRAJE DO HOMEM
O traje do homem é mais simples do que o da mulher e pouco varia em relação ao traje de festa, ao traje do dia a dia, e mesmo ao traje de campo. Normalmente o que varia é a qualidade e a cor dos tecidos da sua confecção.
O homem em dia de festa veste sempre calça à boca de sino assentando a plaina da calça sobre o sapato preto ou de carneira atados com pala sobre o peito do pé. A camisa com nervuras ou aplicação de fita bordada sobre o peitilho ou de folhos fininhos sobre a carcela, geralmente são brancas ou de cores claras. O colete decotado em bico ou redondo são os mais comuns embora em diversa recolhas se tenham encontrado coletes traçados com duas filas de botões aconchegavam a camisa ao corpo. As costas dos coletes eram de cetim escuro ou de cor mais idêntica à cor do fato. A jaqueta era outra peça comum no traje de festa. Tanto quanto possível deveria ser do mesmo tecido e cor das calças e do colete embora se encontrem diversos trajes com jaquetas diferentes das calças e dos coletes pois estas eram as peças que tinham mais durabilidade. As jaquetas mais finas era debruadas a fita de veludo ou de gorgorão com alamares trabalhados e com algumas aplicações sobres os bolsos e os cotovelos de modo a preservar melhor a peça. Para se sentirem mais aconchegados usavam-se as cintas de merino pretas com franja de fitilho ou lã trabalhadas com uma ponta de fora a acompanhar a perna.
Sobre a cabeça, mediante a condição social surgia o chapéu de aba, conhecido com chapéu à portuguesa ou à mazantina caso fossem de uma família abastada, os mais pobres usavam barrete, quase sempre pretos com borla e barra preta embora se conheçam barretes verdes de barra vermelha e borla verde usados pelos mais jovens.
Os adornos não eram muitos embora a corrente de ouro com o relógio de bolso fosse comum nos trajes mais ricos.
Como abafo surgiam as tradicionais samarras com gola de pele de raposa ou de ovelha e as capas compridas com romeira.
OUTROS TRAJES DOMINGUEIROS
Especialmente na mulher encontram-se uma grande diversidade de trajes domingueiros ou trajes de meia-senhora e mesmo trajes de noiva.
Caracterizados pelas saias compridas de fazenda de lã das mais diversas cores, até ao tornozelo, franzidas, guarnecidas com fitas de veludo ou fitas de seda ou fitas de outros tecidos com meias de renda fina branca ou meias de mousse (meias 1111) sapatos pretos de botão ou de fivela. Os lenços da cabeça já não são peça essencial no traje feminino pois os que são usados são de seda lavrada de cor clara. Quem não usa lenço ostenta um carrapito feito de traça de cabelo ou de rolo. Quanto maior for o carrapito maior é a beleza da mulher.
As capas compridas com 6,5m de roda são comuns nestes trajes dando-lhes uma visibilidade muito grande. Utilizam sempre um saco de mão decorado com feitios de costura e rendas para os haveres e objectos pessoais decorados. Usava-se todo o ouro que se tinha como sinal de poderio económico e de condição social elevada.
Muito mais se poderia explanar sobre a diversidade do traje domingueiro da mulher e da riqueza que eles encerram.
O TRAJE DE IR À VILA
O TRAJE DE MULHER
O traje de ir à Vila ou de ir para o trabalho é todo muito idêntico na mulher. As cores mais sóbrias e escuras marcam o dia a dia.
As saias são de algodão conhecido por “riscado” pois apresentam riscos em toda a altura do tecido, são franzidas no cós e com pouca roda. Sobre a saia surge o avental normalmente de tecido escuro com alguns efeitos de costura ou aplicações de outro tecido. Os casacos são de rabo de bacalhau e de padrões mais escuros e mais cheios. O lenço da cabeça de caxemira também é escuro. As pernas são tapadas ou com meias de lã ou com canos deixando os pés desnudados para trabalharem descalças. Os tamancos de pau de laranjeira, pela facilidade de talhar a base, são de couro escuro. A algibeira lateral é mais escura muitas vezes mesmo preta e não tem a função decorativa mas a função de guardar haveres e pertences.
O xaile de abafo é forte, conhecido como xaile dos Pirenéus ou manta. Muitas vezes o xaile é substituído por saias das costas ou saias de acapar. São saias de fazenda muito forte e riscadas. As saias são normais iguais a quaisquer outras juntando o cós com uma costura fazendo uma meia saia e coloca-se pelas costas.
O TRAJE DO HOMEM
O traje do homem também não varia muito em relação ao traje de domingo. Os tecidos para calças e coletes são mais fortes, mais resistentes e mais escuros. Muito utilizado o cotim oficial e militar de cor cinzenta, as fazendas escuras, o serrubeque, o lagrim, o “zularque”, a saragoça, etc.
As camisas são mais escuras e sem feitios de costura. Utiliza-se o riscado, a flanela, a gorgorina, e o algodão. Têm o “pichel” sobre a barriga que serve para prender a camisa às calças para assim não se apresentarem desfraldados mesmo quando estão na vila ou no campo. As cintas pretas de tear aconchegavam os rins para os esforços. Se não existiam cintas utilizavam-se os suspensórios de elástico.
Na cabeça o barrete preto de borla e barra preta era o mais comum embora as boinas espanholas ou boinas galegas surgissem nesta altura e os bonés de cotim ou fazenda forrados a juta grossa.
O calçado era um calçado resistente, botas de carneira atadas ou fechadas ou sapatos de pala com salto prateleira.
Pe. Ricardo Mónica
Maio 2010